27.12.23
Quantamor
Na W4
Passo ao largo
Do edifício espelhado
Meu sorriso, refletido
nas janelas herméticas
Mas amor é enegia quântica
tem seus mecanismos
advinhados por Einstein:
atravessa vidro, concreto, aço, diamante, grafeno
atravessa meses, semestres, tempo, eternidades
atravessa cidades, oceanos, continentes
É histórico patrimônio pessoal
Carece de observação
registro, preservação,
restauração, visita
E uma vez tendo sido
Expande, encolhe, muda
Se perde e escapa de buracos
Vira saudade, vira vontade
Viaja no tempoespaço
num destino mágico e caótico
tipico de Quantamor
Esteja!
Se me abater, me coma
Se me abalar, me segure
Se me adiar, em Roma
Se me adoecer, me cure
Se me secar, me beba
Se me olhar, me veja
Se me achar, receba
Se me quiser, esteja
Crônica de uma viagem
A unha alaranjada
Revê-la me revela:
Como não amá-la?
Na noite craquelada
A lua sentinela
Me viu levar a mala
De como ser afetado por uma Pessoa
Minha musa,
faz ventania
Minha amada,
faz calmaria
Sou vela ao vento,
no improviso
Amar é preciso!
Um porto
Meu coração é porto
Que se alegra
Quando atracas
26.6.23
Un Sogno
Sono un vecchio
En la foto
La ragazza al lato
Bella come la vitta
Nelllo sotterrano del mio cuore
Vive un sogno d'amore
L'unica fortuna di un vecchio
É ancora portare un pó d'amore
Brasília DF 26/06/2923
4.12.22
Expectavida
Era pra ser lua de mel
Virou beliche de hostel
Era pra ser felicidade
Virou fuga da cidade
Era carne e unha
Virou unha na carne
Era foto na paisagem
Virou miragem
Era o lado a lado, o tudo
Virou passageiro mudo
Era um amor espelhado
Virou dor sem atestado
Era pra ser um poema
Mas deu foi pena...
Fui muito primário:
Roma é, do Amor, o contrário
Partículas Espaciais
Isso todos somos,
como somos
cromosssomos
Cosmos somos
Mesmas partículas
Particularmente fractais
Em cálculos imaginários
Gravitacionalmente reunidos
Tão frágil, sozinho, finito
Viajante do tempoespaço
Mergulhei na sua órbita
De partículas especiais!
(Brasília - DF, junho de 2022)
FontAna
Tantos passos nas vias
Veias seculares
De Roma
Pensares esculpidos
Marmorizados
Blocos e ferro fundidos
Tantos joelhos
Dobrados
Imensos palácios
Castelos pétreos
Paredes de ouro
Molduras de argento
Santos, divindades,
Reis e vestais
Cúpulas altíssimas
Obsessivamente pintadas
Te fazem pequeno
Te sabem provisório
Tantos degraus
Ao subterrâneo
Da mente e do existir
Debaixo de Napoli
Tem outra cidade
Cavada na pedra macia
Do rio de lava
Somos seres-cidades
Com tesouros
De persona ocultos
Tantas lágrimas
Sutilmente escorridas
Nas pedras eternas
Guiadas em aquedutos
Num ciclo perene
Fazendo FontAna
SóBrevivendo
Sobrevivendo
Só, bebendo
Breve vida
Vida bebida
Num pub romano-Irlandês
Lagavulin 16
A via de pedra molhada
Da vida improvisada
Turistas tomando un gelato
Poema em sentido lato
(Piazza Navona, Roma, Itália, nov/2022)
1.7.22
Lua de Colheita (Neil Young) - versão Eric Germano - 01/07/2022
Chegue bem perto
Escute o que direi
Feito criança dormindo
Por toda noite, sonharei
A lua cheia surgindo
Vamos dançar, a luz nos atrai
Sabemos de onde a música vem vindo
Vamos sentir a noite que cai
Pois continuo apaixonado, es tu
Quero te ver dançando, meu bem
Pois continuo apaixonado, es tu
Nesta lua de colheita azul
Quando fomos errantes
Te olhava sem me chegar
Quando fomos amantes
Todo meu coração era o seu lugar
Agora já é tarde, aproveite
A Lua subindo vai
E quero celebrar, o deleite
Seus olhos, luz da lua, minha paz
Pois continuo apaixonado, es tu
Quero te ver dançando, meu bem
Pois continuo apaixonado, es tu
Nesta lua de colheita azul
15.6.21
CATEQUESE TROPICAL
CATAQUESE TROPICAL
Se eu fosse um Jesuíta
Embrenhado na mata cerrada
Atrás da índia francesa
Que leva um rio de noite nos cabelos
Emoldura olhos de céu do salar
Vocaliza nos tons de Iara
E sorri mil supernovas
Tentaria catequizá-la!
E sem saber mais de mim
Teria salvado a própria alma
Março de 2021
5.9.19
Who are you missing?
Venus is the Moon's
Piercing
24.5.17
DE ÁRVORES E CORAÇÕES
Outonamente,
as
fo
lhas
ca
indo
ocupadas
em
montar
mosaicos
no
chão,
não viram nosso beijo
florescendo no sofá
As árvores e os corações
perdem folhas, cores, pedaços
sem perderem o destino
de serem primavera
12.8.13
SINAL DA MINHA CRUZ
17.7.13
Homem à vista!
27.3.13
31.8.12
SEQUELA
AMOR NO ÂMBAR
7.9.11
Farsa Primaveril
No Escuro Séquido Arenoso Daquela terra vermelha Que se embrenha Nos cantos, nas ventas No solado dos tênis Made in China No painel do carro Eu, cigarra, espero Minha rabeca alada, espera O tempo, espera Há quem viva na espera Meu coração incerto E insético e asceta Matamorfeia Feio alien - Tocarei Van Hallen Setembro escalda Eu encerrado no cerrrado Sou dependência da espera E a espera é destino às vezes Há quem more na espera... E veio você incauta fingindo ser gota disfarçada de umidade mentirosa água chuva enganosa Era o sinal: Me fez sorrir! Me fez sair, Do berço esplêndido: Tocarei o Hino! Lá debaixo, nem sabia da noite Cavei, Arrastei a casca vítrea Eclodi pronto Enfim, o esperado show do amor Um voo troncho Apressado, sem GPS Escuro, onde está todo mundo? CadêêêÊÊÊêêêÊÊÊ vOcÊÊÊêêê...? Soltei 80 decibéis CadêêêÊÊÊêêêÊÊÊ vOcÊÊÊêêê...? Gritei 100 decibéis CadêêêÊÊÊêêêÊÊÊ vOcÊÊÊêêê...? Esgoelei 120 decibéis Tomei fôlego de ar seco Reza a lenda Repetida por minha mãe que acima disso Explodem as cigarras Silenciei a rabeca Engoli o choro seco Não vi flor Não havia verde Não vi você Só um mar de folhas Dispostas impressionistas No chão e prédios de galhos secos Troquei de espera Depois da sua farsa primaveril Fica a secura Foram-se as lágrimas Esturricaram-se asas Depois os fluídos corporais Ficou a casca Não toquei Van Hallen nem o Hino Não a vi Não há vida Há quem morra na espera Sou a casca |
31.8.11
LÁ FORA Eu estava sozinho sem língua sem internet cansado de andar no meio do rush Babel Entrei na Oxford Circus vestido de ilegal esbarrei no mundo me enlatei driblei apressados na escada entrei no Ovelha e Bandeira tomei um pressurizado no meio dos blazers voltei aos estábulos luxuosos embriagado de solidão |
27.7.11
24.6.09
Brasília 50 anos
Encubram Volpi
Depredem Bulcão
Queimem Galdino
Calem Galinho
Apaguem Galeno
Matem trânsitos
Grilem o verde
Recusem Oscar
Esqueçam Renato
Asfaltem tudo
Fechem pilotis
ceguem tesourinhas
desprezem faixas
Enterrem a W3
Deflorem os Ipês
Aos 50, a cidade já tem avós!
E rugas
Alzheimer, inchaços,
problemas de circulação
Gente do século passado
como vitrais perto de cair
E gente nova chegando!
Pois Brasília, tão atacada,
precisa de uma lipoinspiração:
retirar a gordura cinza
e azulejar poesia no céu
do sonho de Dom Bosco
17.10.08
VER ESTRELAS
Do olho-no-olho
Pareces estrela:
Brilhas super-nova,
Piscas anos-luz.
Desapareces, cometa
E deixas rastros
De cósmica poeira
Nos cílios do vortex
Negro buraco
Que me traga
Prá noite silenciosa,
Pseudo-eterna do vácuo...
E num simples piscar
Big-bang, recomeço
Do olho-no-olho
No telescópio
Bsb, 16/10/2008
__________________________________________________
Do You Yahoo!?
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11.7.08
DO PARALELISMO
- a frase e a fase são suas.
Preferia estar combinando contigo,
agendas,
vontades,
estudos,
sonhos,
como já fizemos.
No fim,
chegaremos ao mesmo lugar...
segues pela L2 paralelamente,
e eu, pela W3.
10.6.08
Com que roupa?
descaminho, descostura
rua sem saída, rasgos
retorno desavisado, desalinho
íngreme ladeira, desbotado
rumo incerto, desabotoado
Sigo a reta míope
sem piloto, sem plano, nem GPS
vestido de possibilidades
14.11.07
Sonho Resposta
Sonhei
que se aproximou de mim
alva, mechas rubras
olhou para baixo,
não pareceu ter vertigens
Desdenhou das pedras,
derramou lágrimazul
nas águas turbulentas
Viu faíscas de sol
nas marolas
e jacarás imóveis,
a sangue frio
secando a fome ao sol
Mandei vento coçar seus ouvidos:
Ffffffffica!
Sou queda inescapável...
e paradoxo para desavisados:
nova escalada!
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Be a better pen pal.
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28.9.07
Carla vai de táxi
E desce na praia
Zumbido do vento em MP3
Areias escalam pernas
E devolvem carícias-pegadas
A espuma das ondas
serpentina aos pés da foliã
vixxxxxxxxxxxxxxx
o sal entra na unha
que sonha uma pérola
Todo o sol, só pra ela!
Sopra o kite vento brincante
surfando morfo-nuvens 3D
Óculos escuros, mente clara
Clarividências à luz do dia
Um se deixar, deixando
desrotina na retina
Nuvens kama-sútricas
vem brincar nas pernas
abertas, portas da vida
Ah, um banho de mar
Janaína quer ter os cabelos
da cor do seu!
Mandou uma onda te buscar
que te alcança
Descansa, Rainha
O mar agora é dela
MAr acajú
Bsb, 29/9/2007
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27.9.07
Tem horas que sou o Jack,
Querendo consertar tudo
Costurando minhas mazelas
Com linhas de marionetes
Que saem das minhas costas
Sou Hurley, preso a números
E insaciável, compulsivo
Devorando horas de tédio
Entre telas, divisórias,
Lâmpadas fluorescentes
Sou Sawyer, do trauma
Do tramado golpe em mim mesmo
Cabelos compridos, do contra
Da miopia, da leitura,
Da preguiça, da acidez
Sou Charlie, da banda
Do vício em ser eu mesmo
Do gosto pelas luzes
Das composições pretensiosas
Do perene adolescente
E Sayd, dos gestos torturadores
Do olhar que vê além
Que ouve o que não é dito
E que sofre para aprender
A conhecer os outros
Entre outros tantos,
Passeio nesses arquétipos
Que em mim transitam
E se digladiam
Roubando a cena
Até que eu, robô-ilha
Num mar de mesmices
Seja tragado pela tsunami
Que se avizinha...
Escutas?
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19.9.07
e não me desespero,
tampouco me destempero
feito feroz Quero-Quero
Todo tempo é um mero
passatempo do entrevero
Passa sempre, é sincero...
Nunca volta, é vero!
Te quis, queria, queríamos, quiséssemos, quero!
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17.2.07
CARNAVALESCO
Já fui índio, pirata, caveira
palhaço no basquete
corcunda na bateria
Boneco-de-Olinda
folião sem eira no Beira
Carrapato no Pacotão
surdo na Dular
frevista sem sombrinha
funcionário fantasma
camisa 10 da seleção
Esse ano, vou de cuíca,
incompreendido instrumento
Sem fantasia, desmascarado
travestido de mim mesmo
carro alegórico desgovernado
Que venha a apoteose
na overdose de gentes
meu bloco, na rua
contramão da razão
na fala ligeira de tamborins
No baile que invento,
não tem solidão de entrequadras
cerveja, anda ao lado
e baquetas procuram nas peles
até acharem o bronzeado do Samba
O to-ca-dor quer beber!
Eric Germano - 16.02.2007
13.2.07
Sulfúrico
Derreti o despertador
No primeiro grito
Os pedais do spinning
No primeiro giro
O tatame da Ioga,
No primeiro acorde da cítara
(que também esvaiu-se em comas)
Fui desintegrando...
O bom dia ensaiado do porteiro,
toquei o botão 6 do elevador,
e meu andar virou fumaça ácida
E, a ordem do dia,
na primeira fala do chefe
Algumas teclas do te_lad_
O tempo foi se carcomendo
Temendo que eu contasse com ele
Cadeira não mais havia
A concentração foi aumentando...
Corri para casa, quase desnudo
Só de olhar, eliminei o retângulo,
a meia-bola e a catedral de Niemayer
Enfiei-me num recipiente envidraçado
E dormi um sono de azedume
Esperando acordar neutro
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Never Miss an Email
Stay connected with Yahoo! Mail on your mobile. Get started!
http://mobile.yahoo.com/services?promote=mail
Cartas Náuticas
Espalhadas sobre a mesa
Aventuras além mar
Especiarias, portos
Sabores exóticos
Devaneios com Walkírias
Ruivas
Outros saberes
Outras línguas
Sabor do vento
Muitas realizadas,
Riscadas em definitivo
Anotações, souvenirs
Pedras, sementes, peles, destilados
Besouros, dentes, escamas
Sotaques, palavras, palavrões
Adagas, pólvora, cicatrizes
Um dicionário de tormentas
Calmarias, enjôos,
Água saloba
Saudades, privações
Manchas solares
Fala Klink,
que o pior é não partir
Naufragar em terra firme
Ver o mar esmeralda,
E não prender vento às velas
Para alguns
Nem todos destinos
Podem ser escritos
Ah, cartas náuticas...
____________________________________________________________________________________
Be a PS3 game guru.
Get your game face on with the latest PS3 news and previews at Yahoo! Games.
http://videogames.yahoo.com/platform?platform=120121
12.2.07
Não é toda foto que me rapta
não é todo quadro que me pinta
não é todo vídeo que me capta
nem é todo drible que me finta
Não é toda orelha que me pendura
não é todo olhar que me fita
não é todo abraço que me segura
nem é todo lábio que me audita
Não é toda lábia que me leva
não é toda aula que me complica
não é todo degrau que me eleva
nem é toda lei que me aplica
Não é todo firewall que me queima
não é todo brilho que me seduz
não é todo acerto que me treina
nem é toda língua que me traduz
Não é toda espera que me atordoa
não é toda vontade que me cega
não é toda paixão que me perdoa
nem é todo beijo que me carrega
Não é,
nem é,
mas talvez,
"era uma vez..."
Seja!
Eric Germano - 11.02.2007
5.2.07
Eita toada boa!
Tá tudo linda:
Borboleta pousa em flor
gira o sol, desalinha
ilumina nas encostas
realinha riscada pele
traço certo infinito
encontro bonito
d´agulha na maciez
desenha tez
Eita toada boa!
Carregas luz
ou é ela que impulsiona
sonhos sonhados
e vividos
emoldurados
no canvas-derme
assinatura
de ser e de brilhar!
Tá tudo linda!
Eric Germano - 05.02.2007
2.2.07
Apesar da ciumeira autêntica que nosso artificial
Paranoá pode apresentar, e dos guitar-heroes que se
rasgam em distorções no tradicional Estúdio Lochness,
dou meu depoimento sobre o tal monstro.
Perto das seis da matina, horário de verão, ou pior,
horário de escuridão total. Após seus roncos
costumeiros, que arrepiam os moradores dos sobrados da
W3, ele se levanta, desnorteado (posto que se entoca
na Asa Sul). Cego pela escuridão da madrugada e pelo
astigmatismo-míope que carrega, se arrasta até o
banheiro, sem esbarrar nas portas - que foram
arrancadas pela sua cauda, desde sua infância.
Incomodava-o, naqueles tempos, ser o último-da-fila na
entrada da sala-de-aula. Além da Ordem e Progresso e
ordens-do-dia, tinha que aguentar a ordem de altura -
coisa do militarismo?
Finalmente no banheiro, veste as lentes-de-contato,
mesmo com os olhos fechados - uma proeza digna de um
monstro. Ao resto do espelho, só resta olhá-lo de
forma desdenhosa. Aquele aspecto não lhe causa mais
qualquer espanto. O monstro reflete no espelho e sente
o cansaço de refletir. Sua juba é um misto de
Elvis-não-morreu com Bozo com Hebe. Fios brancos
atestam a idade mônstrica. Ele não gosta de
aniversários e não se lembra do dia que nasceu. Ele
não gosta de lembrar de absolutamente nada, ainda mais
essa hora. Despenca pela escadaria deixando em cada
degrau um pedaço do pesadelo passado. O espelho fica
feliz em refletir um quadro que ele gosta.
Solta um raio infra-vermelho e arrasta as grades
herméticas da caverna - o Monstro é irremediavelmente
tecnológico e hermético. Sai rodando, pois até
monstros no DF têm quatro rodas. Escuro. Seus olhos
enxergam mal no escuro. Lembra do feijão preto,
estocado no freezer. Dadá alimentou o Monstro com
feijão-preto e broncas. Foi o Monstro que levou Dadá
ao hospital nas duas únicas vezes que Dadá foi
atendida. O Monstro não gosta de hospitais. Na
primeira, Dadá sobreviveu à cirurgia do fêmur e voltou
a andar, fazer feijão-preto e dar broncas no Monstro.
Na segunda, se afogou no próprio pulmão. O Monstro
chorou, mas só o espelho viu, sem se importar com
aquilo. Tentou fazer um poema, mas esqueceu as imagens
que criou. Monstros não fazem poesia. O estoque de
feijão-preto está no fim. O Monstro deve estar no fim
também. Ele não sabe bem de que. Ele sabe pouco.
Por isso, o Monstro deu para se preocupar com a saúde.
Chegou na academia, por volta de 06:10. Só o Monstro e
malucos (pensa ele) freqüentam academia essa hora. A
bicicleta estacionária já o esperava. O professor
manda, o Monstro executa. Pensa nas calçadas da 102
sul, onde pedalou e pedalou. O monstruoso coração do
Monstro, suporta bem o esforço. Como não carrega
sentimentos dentro, é uma máquina otimizada para
funcionamento adequado do Monstro. Terminado o passeio
estático na sala envidraçada, o Monstro carrega pesos
e puxa cabos-de-aço por roldanas, em sala ladeada por
espelhos e vaidades. O Monstro se lembra de motéis,
depois se esquece, como de costume.
O Monstro não entende porque está ali, nem o fato de
que todas as fêmeas no recinto espelhado não
aparentarem necessitar estar ali. O Monstro precisa.
Ele acha que precisa. O Monstro entende pouco de si e
do mundo a sua volta.
Vai para o alongamento. Estica tanto que deseja matar
o professor. Depois esquece disso. Volta para casa
pedalado, marombado e esticado. Bate a cabeça no
varal, no lustre, e se aproxima do freezer, ávido por
um congelado de feijão-preto...
(dedicado à Marcya Reis)
Eric Germano - 02-02-2007
16.1.07
Pois é, o ano se inicia e aproveito para retribuir os votos de boas festas,
feliz natal e maravilhoso ano novo.
Volto rapidamente ao 2006, misturando-o à Perspectiva 2007.
Após deliciante e romântica férias na minha cidade natal, Natal - muito
banho de mar, uma Redinha, um violão, o lado romântico de Pipa
(perfeitamente acompanhado), na volta à Brasília, minha nau encalhou nos
recifes de coral-de-concreto da minha vida: o amor vazou pelo casco, minhas
costas vergaram mais que mastro em tempestade, e a calmaria empregatícia se
instalou de vez. Ali, parado, não poderia mais ficar...
Guardei o que restou do amor na gaveta - aquela que arrumo todo fim de ano.
Passei por exames, remédios, estalações em manobras quiropráticas, RPGs.
Agarrei-me aos livros que boiavam para me levar à praia do serviço público.
Descobri, enfim, que meu problema era o encurtamento: sentimental, muscular
e profissional. Ironia para um cara que sempre pareceu mais alongado que os
outros.
Para curar o encurtamento, usei sua antítese, o A-L-O-N-G-A-M-E-N-T-O.
No mar profissional, atingi uma enseada boa, com um estaleiro onde estou
consertando o casco para viagens, oxalá, transatlânticas. Tenho estudado
cartas náuticas, mapas, o uso correto da bússula e do sextante, para
aprender a usar o leme e o vento ao meu favor. Navegar é preciso, viver...
Na vida, por mais que hajam vertentes religiosas, somos sempre
marinheiros-de-primeira-(e-única)-viagem. Aprender é preciso.
Quanto ao meu arquipélago ósseo-muscular, comecei o 2007 pisando em tatâmes
e me esticando todo, rolando esteiras e erguendo pesos. Estou animado com a
volta ao esporte assistido por professores, já que a natação feita no modo
self-training me rendeu uma baita lesão na cervical. Quem sabe, termino o
ano medindo dois-metros-e-dez. Menos corcunda, já estará de bom tamanho.
Perdi o rumo total no oceano sentimental. Talvez os corcundas só sejam bem
cotados em Notre Dame... Problema de auto-estima e alguns kg a perder, o
esconder-me atrás dos livros, meu automóvel ser do milênio passado. São
várias as causas, todas desaguando na solidão. Bem verdade que a música tem
me salvado ou me levado à loucura total. Ainda não é tempo de desistir, e o
canto de alguma sereia há de tragar-me para o fundo do aquário de um novo
relacionamento que se prolongue até onde tiver que ir.
Sem mais delongas, que todos se alonguem em suas vidas e que em 2007 o mar
esteja para Peixes, Gêmeos e outros zodiacais.
03.01.2007
1.11.06
Boiando, somos peixes
Vertebralismo materno nos suporta
Quem nasceu, venceu ao menos um ciclo:
Formados em citologia aplicada
Somos a bolsa
Que sacoleja em cada degrau
O som distorce-se em tecidos
O alimento, chega-nos em tubos
Nada de luz... mas há saída
Antecipada, marcada, conforme a Lua
Somos expulsos, ou arrancados
Deixamos cicatrizes, levamos códigos
Quase decifrados, quem se importa?
Nem todos trocam a bolsa pela vida
Pois amar a bolsa é amar uma promessa
É uma dívida, hemoláctea
São medidas perdidas...
Sem afeto, não há feto
Desfeito, em hospitais clandestinos
Da bolsa ao saco-de-lixo
Por saudade da bolsa, vamos ao sono
Aos sonhos...
Acordar é brincar de renascer
E na vida, pós-bolsa
A recorrente pergunta:
Abort, Retry or Fail?
Set/2006
O ano e os monumentos voam
Perto, o dia de ser independente
As cigarras sentem o cheiro da chuva
E afinam aladas rabecas
Ensaios de temporais riscam o azul
Guarda-chuvas para prevenidos
Ensopados incautos na rua
Poças, splashes, caos automotivo
Mesmo com tamanha água
O Paranoá escoa
Nunca chegará às 700!
Inundaria a cidade inclinada?
No Tatuapé
Margarida perdeu sapato
no aguaceiro...
Em Jundiaí,
Ladeiras eram cascatas de paralelepípedos
E caravelas de papel
Em Sorocaba
Eu não sabia da aula
Quando chovia
Em Tubarão,
O rio foi ao Centro, marcou paredes
Marcou-me também
Logo, Brasília, férrica-cinzenta,
Retornarás verde
Cigarras reverterão a gravidade
Serão frutos nas árvores saciadas
Num sonoro namoro
Brasília, é Setembro!
Que venham águas
E lavem gentes
Amantes, dependentes
De ti
set/2006
5.8.06
Quase tudo muda o tempo todo. Até eu, exímio poste ambulante cabeça-dura, às vezes meto-me numa mudança. Depois de 16 anos servindo à iniciativa privada, adentrei, após provas e reprovas, no serviço público. Virei FUNcionário Público! Abraços em Bruno,
Profeta-Guru dessa empreitada!
Cuidarei dos desasistidos ou “invisíveis” do Estado, ou melhor, dos projetos de transferência condicionada de renda. No Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, conhecido como MDS, vou fazer uma vida em 4 anos, já que o cargo é temporário. E o que nessa vida, não o é?
Engraçado... vestir o terno, usado geralmente em ocasiões especiais e nas entrevistas de emprego, comprar cêra e engraxar os sapatos, assinar umas papeladas, parar o carro próximo ao Anexo, subir uma escada, entrar na recepção e não ser barrado, pois o crachá verde de ansiedade indica passe-livre. Depois de um tempo nas asas da W3, virei Monumental...
Conhecer gentes novas, idéias novas, novas coisas a fazer. Ainda sem lugar para me sentar, e pior ainda, sem teclas para teclar, conheci chefes e colegas – e desenhos de cronogramas, o banheiro, textos esquisitos de acordos internacionais. A sensação verdadeira da primeira bicicleta, do primeiro beijo, do primeiro dia na escola... Tudo novo, quase Colombo e seu ovo, de onde nasceu esse mundo afora.
Na saída, o inacreditável pôr-do-sol, colocado ali por Niemayer e Bulcão. A quem um dia sair do bloco C da Esplanada indo em direção aos anexos, por volta das 18 horas, recomendo olhar à direita: nuvens multicores servindo de moldura para a catedral, remodelada pelas curvas do museu geodésico; a rodoviária incendiada pelo adeus solar, e a Torre de TV, como um míssil, atingindo o céu.
De novo, já tenho bons motivos para ir e voltar do trabalho!
01.08.2006
18.6.06
Agora, na mochila
Cochilam artefatos
Pouca arte, poucos fatos
Fatalista, quase morto
Quasímodo modulante,
Modificada arquitetura
Quem atura, quem se atira
e não mira palmo adiante?
Antitese do ser
Doce de cicuta
Escuta, que já não canto
Nem santo, menos bandido
Tremido, o traço avança
Me alcança no meu abismo
E cismo nem ser comigo...
Comédia sem qualquer riso
Improviso uma saída
sofrida como uma falha
Valha-me Deus! Volto à fila
Mochila ao precipício
Meu vicio e ser só isso
17.06.2006
9.5.06
Noite de sábado. Tambores, ganzás, baquetas, apitos e o tubo plástico de Redoxon são os passageiros do carro, que vão se aquecendo e produzindo sons familiares para mim, a cada nova curva ou buraco no asfalto. Vou na monotonia do eixinho “de baixo”, sentido sul-norte. Saio da 7 sul para tocar na 111 norte; em Brasília, dezenove horas, mas sem Voz do Brasil, pois no sábado, Brasil se cala no rádio, falando muito nas mesas dos bares.
Como um tiro, um estampido ecoa dentro do carro. Pneu furado? Novo efeito percussivo? Demorei uns segundos sem descobrir a fonte sonora. A resposta estava a meus pés. Precisamente, no pé esquerdo. Foi-se o cabo da embreagem. O pedal, sem vida, foi sugado para perto da carroceria. Como estava com a marcha engatada, decidi
tentar o retorno em forma de tesourinha que se aproximava. Certas horas, meia-volta-volver é a única opção.
No embalo do câmbio, que parecia tão favorável quanto o dólar atual, fiz a tesourinha e ensaiei a subida pela outra, que me levaria ao caminho de volta. Fiquei. Nunca fui bom em Física mesmo... Pisca alerta ligado. Outros carros, manuais e hidramáticos, não quiseram saber do meu drama. Fiquei.
Um Fusca, meio azulado, parou atrás, e ali ficou. Sinalizei, mostrando meu polegar para baixo, reflexo de como me sentia. Gritou o motorista:
- Quer que eu empurre? Estou de Fusca!
Pensei cá com meus pedais quebrados, que eu também estava num Fusca, já que Golmil era seu substituto natural. Ele desceu do carro, veio pacientemente até minha janela, e sugeriu empurrar meu Fusca, perdão, meu Golmil, tesoura acima. Os instrumentos se entreolharam, pedindo para serem salvos de tamanho
embaraço. Pensei no parachoque, que devia aguentar um outro Fusca a empurrá-lo. Quem não tem cão...
Subimos a tesourinha, devagar e divagando, segurando uma fila de impacientes, que não entendiam o que era aquele estranho comboio. Chegando ao topo, paramos um
pouco para rir e analisar a situação. Ele disse seu nome: Rafael, fotógrafo de Senador – até isso eles têm? Como um posto de gasolina estava bem próximo,
resolvemos que o procedimento de empurrar-com-o-bigode do Fusca deveria continuar. Ali seria um bom abrigo para meu avariado meio de transporte.
Lá chegando, ele se ofereceu para levar, eu e minha bagagem musical, para a Asa Norte, pois ele ia para o mesmo lado. Aos poucos, fui transferindo as coisas
para o outro veículo. Um Chevette anos 70 entra no posto, e começa a encher os pneus. Era amarelo, daqueles desbotados. Eu tive dois Chevettes: um 80,
chamado carinhosamente de “chevelho” ou "gerimum", por conta da cor, e um 92, com o qual matei um cavalo em Taguatinga.
Abrimos a tampa, e o motorista do Chevette se aproxima e pergunta o que houve. Falei da perda do pedal. Maranhão, seu nome, é mecânico em Taguá, e explicou que passa as noites de sexta e sábado dando voltas no Plano, acodindo os desesperados das pistas. Disse que tinha um cabo que serviria no meu carro. Dito o preço, e aceito sem negociação de minha parte, pois as horas brincavam de passar, saquei uma nota de cinco que Raphael - agora com “ph”, pois vi na sua carteira de jornalista - , fez trasformar em duas latas de cerveja geladíssima.
Maranhão trabalhou rápido. Secamos as latinhas. Fiz o pagamento do combinado, testei a pedaleira recuperada. O trio insólito foi desfeito. Nos despedimos como estranhos que éramos, unidos repentinamente por uma causa.
Devolvi as coisas, que pareciam felizes-para-sempre, para meu carro. Parti para a Asa Norte. Se eu fosse o Paulo Coelho, eu diria que Raphael, com “ph”, era um anjo, e que Maranhão, mesmo sem a indumentária certa, era um elfo consertador ou alguma criatura mística.
O imortal escritor, não anda mais de Fusca, como andava nos tempos do Raulzito. Raphael, só achou graça da situação, sempre enaltecendo a bravura do Fusca, não tinha asas, e o bafo de cerveja entregava sua humanidade. Maranhão, trocou conhecimento por dinheiro, como era de se esperar.
Toquei a noite quase toda, e a todos que pude, contei a história. Apesar do convite para mais uma cerveja por conta, Raphael não apareceu no bar. Será que estava a empurrar mais alguém?
Para mim, Raphael foi o bêbado mais solidário que conheci; anda em um Fusca com placa de Natal-RN, e vive de fotografar autoridades. Maranhão, mecânico-visionário, que busca as oportunidades do ganha-pão nas estradas da vida, salva muita gente todos
fins-de-semana. Sobrou para mim, nessa história, ser somente o cara de muita sorte.
Eric Germano - 8/5/2006
E para você, leitor(a) que pegou carona nesse Auto Móvel, fica o telefone do Maranhão, para alguma emergência:
Maranhão: 61 9260-9826
Do Rafhael, não peguei o contato para fotos, só a vontade de trocar meu Golmil por um Fusca, rs.
13.4.06
Saxofone chora na kitnete
Manchetes esquecidas varrem o asfalto
Senhor de terno vai sem rumo
Mulher repara a vida na janelavaral
Bêbado vira semáforo
Tudo pára.
Pneu arranca o fim da tarde
Ah, universitárias...
A alegria passageira na vã escolar
Dois quiques na bola de basquete
Amizade atravessa a rua
Eu paro.
No Sebo iluminado,
letras pretas esperam alforria
Espero...
Até que um visitante
Pegue o livro da minha vida
Livro-lápide onde jazem os tipos:
“Vivi, mas não tenho nada a dizer”
E, só.
27.3.06
Descobriram o atraso
no meu ramo direito
vai bater, não bate
bate na hora indevida
mas bate maquinalmente
erro nascido
ou ganho nas brigas do Garrafão
Sou menos direito...
como o surdo no Frevonon
descendo e subindo
ladeiras de Natal
Doutor, não sejas taxativo:
- Nada tens no coração!
E esse insistente barulho?
Dor...Dor...Dor...Dor...
24/03/2006
22.2.06
Lá vem o mocinho do Farwest
Os passos firmes, medidos
O vento voa a trezentos por hora
E o sol incendeia, carboniza
Nas telas, fossilizados
O vemos passar
Não dá tempo de sentir medo
É o galã da Paramount
Orgulho de Hollywood
Quantas fantasias e aventuras
Agora é o carrasco
Que joga a chave do calabouço fora
E suas risadas tropeçam escadas
Ele é um durão
Não chora, não recua
Não pensa.
Só espera a hora
De livrar o cinturão de suas imbecilidades
É a sétima pistola de prata
Nas mãos de um covarde
E o mexicano tomando tequila
Tem seu chapéu perfurado no chão
Nem sequer pensa em apanhá-lo...
Se estou pálido
É que ninguém acha mais bonito
A porta do salloon se abrindo
- é o princípio do duelo
Aquela ânsia
Aquele tremor
Aquela tensão
Aquele suor
E o estampido
Resvala a alma
Acaba o tudo
Eric Germano - 1990
20.10.05
ROLO
No meio da sala
tinha rolo de fita
toca-fitas de rolo
Americanas orquestras
de Miller e Dorsey
Românticos de Cuba
as maracas, a clave
coisas do pai
tão minhas
meu bongô, meus grilos
entre o dever de casa,
o Mundo Animal
e a dilacerante descoberta
do amor
em italianas canções
"Roberta... perdona... ritorna..."
Quando a encontrarei novamente
naquele asfixiante eleva-dor?
7.9.05
Deságuo de novo
No eixo rápido
De luz âmbar
A pressa contida
Nos olhos despalpebrados
Dos pardais
A reta imposta
Dos olhos de gato
Velocímetro, vento, veia
A sucessão regressiva
Das superquadras...
Onde é o centro?
Ah, Alvorada e Buriti
Distantes das gentes...
Seus espelhos d´água
Não refletem a narcisista
Pátria Mãe
Aqui nasceu meu filho
Que não viu Cássia
No Bom Demais,
As noites no Galpão,
Nem comeu um Mafioso
80, limita o mostrador...
Sobre nossas cabeças,
aquela bandeira
trocada por Dragões
que por sorte
continua a mesma:
Um campo de futebol,
Um balão de São João,
O céu da capital,
De estrelas inegáveis
Tá bom, nem somos independentes
Mas estamos vivos para sermos
Quando via os desfiles
No Eixão
Não sabia do medo
E quem quer saber?
O desfile, mudou-se
A cidade, é outra
Eu, que nem vim para construir
Acabei concreto
17.6.05
Cacos
Já estou de vidro novo, e a cicatriz de fios coloridos no painel ainda me causa certa raiva. Pratico agora direção silenciosa, ouvindo meus pensamentos; não sei mais das notícias, nem sempre boas, sobre o Brasil. Não posso mais mudar de estação quando algo me incomoda, mas mudo de faixa, costumeiramente, quando algum lerdo ou desocupado da vida insiste em impedir minha trajetória. Vermelhos, amarelos e verdes passando, as asas ficando para trás, onde deviam estar...
Acho que paguei 170 naquele auto-rádio-K7; gastei outros 50 no reparo do vidro. Hoje, andei de ônibus duas vezes, na ida e na volta da oficina-vidraçaria; que misteriosamente, estava vazia quando cheguei, por volta de 9:30. Trocou de dono - antes era do irmão do Lourenço, que parece-me, deixou de ser vidraça e pode ter virado pedra...
Tive uma manhã calma, aprendi algumas dicas. Andei de ônibus hidramático, cujo motorista exibiu uma pilotagem dramática. No seu headphone, devia estar tocando alguma música para dor-de-cotovelo, pois ele descontou no bólido e nos desavisados passageiros.
Depois do almoço, quando estava a estacionar, vi o lavador de carros, a quem doei um boné, para o sol cáustico desses dias frios. Engraçado, não sei o nome dele. Atrás do meu carro, parou desanimado catador de papelões, papéis e toda sorte de restos de empresas e pessoas. Figurino digno dos últimos dias da humanidade que estão por vir, grunhiu de sua boca de dentes ausentes, um pedido de vinte centavos... como a Casa da Moeda não distribui devidamente nesse desigualBrasil, e nem ouve a voz das ruas que clama por moedas não forjadas de 20 cents, vasculhei meus bolsos pelo vil metal. Ia buscar no carro, mas ter que rever a ferida no painel me fez desistir.
Acabei achando uma moeda de 1 real, aquela prata-ouro, na minha calça multi-bolsos. Ela refletiu o sol quando passada para a mão do catador, que agradeceu, desejando coisas boas para minha família. Pensei na família dele e pensei no meu expediente. O vidro foi sanado, os cacos, aspirados. O toca-fitas se foi, levando dentro de si uma fita do WES, sucesso em Camarões e raríssima nessas pairagens. A moeda se foi. Tranquei o carro. Conferi as portas, como de costume. Ficou o sorriso sofrido do catador de papéis, que agora carrego comigo, e ninguém pode roubar...
6.6.05
TRINTA E SETE
Aos 37,
Não quero mais planos...
Todos já foram feitos,
desfeitos, revistos, revisitados
arquivados, reciclados, esquecidos
E ainda estou no mesmo
eu mesmo
Em 37,
Minha grande proeza:
deixar para trás zilhôes
de espermatóides lerdos
Depois, ser viável
no ventre quente de Margarida
comer do pão de Germano
andar aos olhos de Dadá
fugir dar freiras cortadeiras de unhas
voar no velotrol veloz vida
Durante os 37,
quantas partidas de basquete
amores platônicos,
livros, discos de vinil,
coleções perdidas, empregos,
cursos e alunos,
instrumentos e palcos,
amores de verdade e
verdades de amor
modernos amores virtuais
mentiras atiradas
sim e não, aos montes
bem-quereres, mal-queridas
37,
Só um filho
que é tudo que não posso mais ser
nem seria, pois não está em mim
descobrir a vida nesse mundo novo
que todo dia inventa de existir
37, 37,
Tudo que tenho, cabe no meu Gol
moro com a Mama,
como um filho de italianos,
insistindo na solteirice
de gato escaldado,
ou no meu papel
ex-playboy classe média
37, 37, 37,
Não sou chefe
Não mando nada
Só executo e converso com telas
e dígitos mal traçados
37,
Não quero mais planos...
Mas vou tomar uma,
ou várias,
in momoriam do que passou
e do que virá!
Eis meu brinde:
Que venham mais 37!
Não estou preparado
nunca estive
E quem não aprende
o ano repete!
21.5.05
Meio
Meia noite
Meio deprê
Media luz
No meio fio
Meio homem
Fruto do meio
Meias verdades
Meio pavio
Maio, é quase meio
Gol do meio de campo
Meio de dizer, é mídia
Meio seco, é estio
Caminho do meio
Meia furada
Cara metade
Meio ardil
À meio pano
À meio mastro
Meia hora
De ócio e de cio
Meio distante
Da Praia do Meio
Meia garrafa
Meio Doril
Ao meio-dia, fome
meia 4 Queijos
meia Marguerita
nesse corpanzil
Meio tanque
Meia bomba
Buraco no meio
CD ou vinil?
Meio de vida
Vidas ao meio
Meio da rua
Semáforo, frio
Meia-vida do Césio
Goiânia ao meio
O meio ambiente
O ar, o brilho, fuzil
Meia entrada
Meio-a-meio
Levou a metade
Quanto partiu...
26.4.05
Outra Canção de Abril
Por aqui, nesses altos planos
ninguém gosta de céu cinzento
nosso mar, adoecido, de ressaca
Como pescar imagens em nuvens?
Outrossim, a seca atrapalha
transforma gramados em cinzas
que qualquer ponta de cigarro
consome no cheiro rápido de fumaça
E entre secos e molhados
os últimos de Abril escoam
motoboys voam sobre espelhos
com vestes de super-heróis do rush
A folhinha já vai virar cinza...
A maior magia desses dias
foi ouvir a locutora língua-presa
da Nacional, minha trilha desde 12
falando alforriadamente,
sem ésses sibilantes
e destravada!
Bom é viver Abril com a língua solta!
12.4.05
Abril ensaiou inverno de ventos
serenando suave nos edifícios
em carros, gente, apartamentos
outono, eu todo, ouvindo Vinícius
Cigarras mudas, dormem enterradas
cultivando seu amor primaveril
no silêncio das Asas paradas
na capital crisálida do Brasil
E volto para casa, reticente
no rádio, Águas-de-Março de Tom
orvalhada alma, corpo e mente
Abri ouvidos, para o outono-som
que seria verão incandescente
se fôssemos nós, dois-em-um-edredon
8.4.05
Hoje eu tava precisando
de um abraço silencioso
daquele que mata a saudade
e fala tudo, sem palavras
No toque surdo, dois corações
sincronizados no beat
esquecer o rush, o Bush, o ponto
aquecer as linhas das mãos
Estancar o sangramento
das horas vazias
Olhar mais do que o visível
e sair de mãos, finalmente, dadas
6.4.05
Hai-kais e Curtas
Saudade me desafia
se te vejo
na fotografia
Perigando
Paixão é perigo:
minha língua,
seu umbigo
Retrato
Amar é um fato
que até cabe
num retrato
Aquecimento
Como pode o amor ser cego
se vivo ao te ver?
É chamado de irracional,
e quero mais te saber?
Transpassa o peito, é punhal
e faz o coração bater?
Nem sempre pode durar,
mas sempre pode acontecer!
23.3.05
Tão pesado como âncora de transatlântico
O dia se arrasta...
E trás à tona pensares subversivos
Hoje me cortei fazendo a barba,
cultivada desde sexta
A camisa tirada de cabide, estava amassada
- É a minha cara!
Amaldiçoei motoristas mórbidos,
Contei segundos comunistas em semáforos
Desacreditei os engenheiros de tráfego
Depois foram telas, teclas, caracteres sem caráter
A pressa está nas coisas, mas não no tempo
O tempo tem poderes, tem políticas,
tem possibilidades
Ainda por cima, li que os astros
estão mal posicionados, atrapalhados...
O que me resta é tomar,
urgentemente
Uma pílula do dia seguinte
22.2.05
FIM
Rasguei suas fotos
Num ritual desesperado
E deixei os negativos
Para serem revelados
Em outras horas, outras almas
Tento esquecer a despedida
A platéia explode em palmas
Vendo sua lágrima fria
E eu fugi pra Porto Alegre
Madrugadas blues no Van-Gogh
Ninguém me ouvia, ardia a febre
O amor vem, entorpece, morre
Ninguém entende a cena, afinal
Dois que se gostam
Morrem secos na Água Mineral
Ninguém entende a cena real
Dois que se gostam
Não ficam juntos no final
No seu passado
Qualquer conversa de bar
era um perigo
Uns se venderam, por dinheiro
e sem castigo
Um de estrelas, sem luz
Era inimigo
Confronto armado
Quem não se entrega,
bate à máquina um artigo
Quem não se cala, fala rente
Ao seu ouvido
Porrada, fumaça, sumiço
Onde anda seu amigo?
Dilacerado
Desfez da gente, Brasil prá frente
País vendido
Ou ame ou deixe, entrega o ouro
Ao bandido
Tiradentes? Agora é tarde,
país falido
No seu presente
Ecoa seu voto, seu pranto, seu rock
seu grito
As caras pintadas, panelas, buzinas,
Apitos
No céu da esperança, a raiva guardada
Assusta-te o mito
Voltar às trevas? É um absurdo!
Legado maldito!
No seu futuro
Que frutos colher, que porta escolher?
Seremos maduros?
Crianças cegas, prostituídas
Com medo do escuro
Floresta deserta, falando inglês
Atrás de um muro
País delinqüente, atrasado, indecente
Escravo e burro!
3.1.05
Everest e o Novo Ano
Se tem uma coisa que me intriga, é o fato de que algumas pessoas vivem para escalar montanhas, onde gelo, cordas, hipoxia, barracas, sonhos, deslizamentos e ambições fazem parte do cotidiano.
Para os viciados em tal prática, seja por prazer ou profissão, o Everest é sempre o objetivo mais cobiçado. Com várias faces e opções de chegada ao cume, todas levam o ser humano ao limite de suas forças. Mas para que tanto esforço?
Dizem que na tal montanha, uma Deusa decide quem vai atingir o ponto máximo, quem vai apenas sofrer, quem vai perecer na tentativa, e até mesmo, quem nunca vai ter a chance de chegar ao menos no sopé da colossal formação rochosa. Para muitos, é apenas marketing ou turismo; para poucos é uma missão de vida, ou de morte.
Na base da gigantesca rocha está o povoado Sherpa. Devotos da Deusa, atribuem poderes mágicos e vontades humanas à montanha. São os carregadores de equipamentos e sonhos de outrem. Arriscam suas vidas como forma de ganhar o pão e garantir que seus filhos não tenham que se submeter aos caprichos dela. Os caminhos para o topo são trilhados por eles com maestria e sem o júbilo dos ocidentais; são os responsáveis por fixar as cordas e as incríveis escadas-pontes de alumínio. Além disso, ainda têm que operar as digitais câmeras para registrar os heróis ocidentais.
Por volta dos anos 50, um inglês e um Sherpa foram os primeiros a conquistar o pico. O Sherpa voltou ao povoado elevado à categoria de divindade. O inglês, fez a história, contada sempre na versão dos vencedores. Ficou claro que nenhum dos dois chegou primeiro, apesar das disputas promovidas pela imprensa e entre os povos. Um sem o outro não chegaria a lugar algum...
Cá embaixo, longe do frio e da falta de oxigênio, a cada ano renovamos nossos objetivos pessoais. Escolhemos um alvo, uma meta. Um novo emprego, um novo curso, estudar para um concurso, um novo relacionamento, um carro “do ano”, um novo corte de cabelo, aquela dieta, um novo filho. Nunca satisfeitos, nos agarramos aos nossos deuses e divindades, tentamos encontrar uns Sherpas no nosso convívio, pegamos nossas mochilas e equipamentos e vamos rumo ao nosso Everest. Conquistar faz parte da nossa natureza. Tentar algo novo e difícil, é nosso destino!
Um 2005 repleto de Paz e Bem!
17.12.04
Só, posso ir...
Só posso ir!
Posso ir, só!
Ir só, posso?
Só? Posso ir?
Só ir... posso!
Posso.
Ir,
Ir,
Ir,
Só...
14.12.04
Pra que toda pressa?
pra que toda posse?
punhal que atravessa
corpo que se contorce
Parem toda a festa!
Ainda que não goste.
O gole que te resta,
e a luz no frio poste
Sua vida, desgaste
piromágica disfarça
caravelas, contraste
entre ego e farsa
Os mortos, enterre
esqueça os em coma
na vida, não erre
o elementar axioma:
Veja, viva, ame, coma!
e deixe-os ir, terminais
quando amanhecer...
1.12.04
Perfeito engenho, robótico poema
de alto quiláctea, prima-obra
sussurro luminoso de super nova
estelar mapa, galáctico esquema
Venusiana, tens várias luas
vários humores, difusas marés
brilhas em anéis o que tu és
pouso a nave-mão nas costas nuas
Sou robô de marte, programado:
colher pedras, digitalizar fotografia
redescobrir um fato consumado
Aterrisei em ti, Vênus, na ousadia
de te explorar, e acabei queimado
na tua alva pele que ardia...
17.11.04
Ao Pé-dra-letra
Já fui ouro para tolos,
ingrediente de bruxas-fadas,
paralelepípedo em Jundiaí.
Misturado, virei tijolo,
marco-zero de mil estradas
pedra-de-toque do Dali
Derrubei um tal Golias,
incomodei no sapato de tantos,
espreitei topadas no caminho...
Do seu rim, não me repelias,
enfeitei coroas e mantos,
fiz história num moinho
Raras vezes, sou lunar,
sou pirâmide para o rei
pela ganância, sou cavada
Pétrea cláusula, insular,
vim do pó, ao pó irei,
sou a primeira a ser atirada,
Essa pedra bruta,
de granítica desenvoltura,
e que já sonhou ser rolante...
Repousa hoje em escura gruta
para escapar da loucura
de não ser um dia, amante
8.11.04
Queridas e queridos
Indecisas e indecisos
Mal ou bem resolvidos
Envolventes e envolvidos:
Se o assunto é festa
reunião, ajuntamento
qualquer cardápio presta
é a mais-valia do momento!
A casa da Gilka, pena, quase sem Carola
Os acompanhamentos de Ana...
os espetos de Gonzaga fazendo escola
e as pizzas deliciantes de Suzana!
O viajante Jerê, de mala pronta
A Meg ultra-super-ocupada...
não viremos barata tonta
pois nossa tchurma é da pesada!
Assino o jantar se for consenso
ou o churrasco, ou um quitute
na pizza, de fome, eu já penso
Só não vamos acabar no Beirute!
Adorei o convite, tô dentro
Nem só Juá merece medalha
Nossa turma, no mundo, é o centro
E quem é da nossa trupe não falha!
3.11.04
E você, grande amiga
que desbravou meio Brasil
bateu pernas
no primeiro mundo
Mudou de área, de capital,
de amores
Fez tanta gente sorrir
Com seu sorriso
de arco-íris
Deixou saudades,
marcas indeléveis
de estréias e desejos
nas almas de poucos
afortunados
Nessa data especial
perdida no meu calendário
e que nunca esqueço...
Queria brindar contigo,
falar além das micro-ondas
de celular
dar-te um macro-abraço
d e m o r a d o
e um até breve!
Eric Germano - 03-11-2004
10.9.04
Textos erráticos
nuvens negras virtuais
miragens e outras vertigens
córtex dilacerado
homem das cavernas concreto
Na busca de um buraco
para enfiar minha testa de avestruz
parem o mundo!
parem as prensas!
parem a pressa!
No meio do rio, estou de pé
mas estou sem ar
sem fugas nem artifícios
emboscado, babaca dentro de mim mesmo
À beira da loucura
dos que insistem em viver
me desconheço, viro fumaça
viro risada nos corredores de mármore
escorrego nos granitos da minha mediocridade
me ajudem, oh deuses-garçóns do Beira
Ligue para os bombeiros
que meu amigo vem de helicóptero
chame o síndico, berre no interfone
sou alto-falante, vendendo eu mesmo
vou pulando do tudo ao nada
como quem tenta subir escada rolante
que insiste em descer
Às vezes, preferia ser Nosferatu,
pois foi duro me ver no espelho...
9.9.04
Tic-tac, tic-tac
passam segundas intenções
tic-tac, tic-tac
voam minutas de poemas
tic-tac, tic-tac
passam imagens de outrora
nhac-nhac, nhac-nhac
mastigo o ventre de seus verbos
nhac-nhac, nhac-nhac
dente-a-dente, céu na boca
nhac-nhac, nhac-nhac
trituro sua carne boa
tic-nhac, tic-nhac
atrás de um momento eterno
nhac-tac, nhac-tac
água-na-boca, boca-na-boca
tic-tac, nhac-nhac
d e m o r a d a m e n t e
Eric Germano - 09-09-2004
2.9.04
Ah, pernas pra que as quis...
Engatinhei no olhar de Dona Rosa,
Pulei corda com ZéHenrique,
Caminhei em busca de um Lozano.
Percorri maratonas de quadros-negros,
carreguei Jú é Marco, dois tesouros!
Acelerei, apertei o freio, na estrada da vida...
Abri caminhos para Eric e Denis,
filhos emprestados,
e para tantos anônimos.
Nessa toda locomoção,
carregou Rosa até o fim,
movida a bom-humor, bom-amor
Ah, pernas pra que as quis...
Pernas pra que as quero:
Correr atrás do neto,
correr atrás dos novos sonhos
Caminhar com Lozano,
visitar ex-alunos
Mudar de ares,
dar mil voltas ao mundo...
Mas, pernas também pedem revisão
Foram-se as safenas...
Que se vão!
O que move essas pernas
Não são quadríceps, patelas, veias
É o que vem do coração!
Eric Germano – 02/09/2004
25.11.03
Poema da Vendedora de Brincos
Na mesa de plástico
De casaco verde e jeans
Ela toma coragem
No líquido gelado
Para caminhar mesas
E olhares, indiferenças
Vendendo vaidades brilhantes
Para orelhas
Que não a ouvem...
11/2003
Tipo Exportação
Pô, carái, véi, fí!
Não dê mole pro azar
Que um tal de José Murphy
Vem aqui para desfilar
Não trampou essa semana
Vive sonhando com o Greencard
Limpar latrina americana
E comer bacon no jantar
Com esse sotaque calango
Tu não vai zooropizar
E por aqui tem muito santo
Disputando o mesmo altar
Vê se funda uma ONG
Pra se reabilitar
Os brazucas passam fome
No país dos Carcarás
Carcará! Pega, mata e come!
11/2003
Face à face
Tudo começa com a face...
Mas eu me lembrei
Já te vi antes
No fim da tarde
O profeta deu um passe
Tudo começa com a frase...
- O meu nome é Sidnei
Virou a cachaça, delirante
Cantou uns versos em voz forte
- O tempo manda, não se atrase!
Aquele surrado rosto
Era mais um na multidão
Dos enlouquecidos e esquecidos
Que temos dentro da gente
Como um espelho tosco
E no profeta eu me via
Pela voz dele, eu gritava
Aguardente na garganta
Que era minha
E que não embriagava
Era tudo sintonia
E ele nem ali estava
O que muito mais espanta
Eu aprendia
E ele nem falava!
06.09.2003
16.9.03
Beira
O que mudará no próximo minuto?
Quero te encarar
Não mude de assunto
Jogar conversa fora
Continuar aquele papo
interminável
No Beira já apagado
O vidro virou plástico
As festas sobre a mesa
E o gole rápido
Mesa invade calçada
Grito mora na quadra
Outra madrugada
Passa o tempo
E somos parte do lugar
Íntimos em cena
Irmãos de copo e alma
10.9.03
Não posso mais ter...
O que quero enviar
Coisa alguma pode conter
O que quero te dizer
Você não vai escutar
Escuta, então, a canção no ar
É assim que vou chegar
É assim que vou aparecer
Mesmo que não me reconheça
Não se importe, nem perceba
Nas tantas horas de saudade
Agito suas mechas douradas
Disfarçado de vento vadio
Que fugiu de Laguna
Atrás de suas esmeraldas
Você não vai escutar
O que quero te dizer
Coisa alguma pode conter
O que quero enviar
Não posso mais ter...
O que quero de você.
4.8.03
Às vezes, falar não posso
Às vezes, entender eu custo
Às vezes, sorrir eu engulo
Às vezes, o pulmão eu anulo
Quanto mais calo, me afundo
Quanto menos entendo, mais escuro
Quanto menos sorrio, mais retraio
Quanto mais apertado, me diluo
Por vezes, no espelho, me engano
Sou estranho, estrangeiro, intruso
Quase sempre estou inconcluso
Nota fora da pauta, desumano
Quantas vezes talhei novo plano
Tantas vezes sofri infortúnio
Na tênue linha d´água, boiando
Na espreita, irônico, o Fundo
E se, tenho que calar
tenho que custar
tenho que engolir
que anular
não entender
me retrair
apertar
me iludir
estranhar
nada concluir
planejar
falir
flutuar
cair
É porque tenho que viver,
mon ami!
22.7.03
ROTINA
Hoje, não tinha o que fazer...
acordei tarde, perdi o almoço
pulei na rede para espairecer
procurando da banana, o caroço
A tarde fugiu, vi a Leda
ledo enganando-me, sutil a noite
corri, antes que eu me perceba
pele branca sob meu açoite
Estou desempregado
sem uso
claustrofóbico em mim mesmo
não careço de acordar cedo
nem de bater o ponto
culpa dos autômatos?
A vida, não é brinquedo!
A pior das rotinas
é nada fazer!
9.12.02
DA CHUVA
Chovia forte,
e os pingos insistiam
em atravessar vidros
percurtindo,
lavando
respingando,
escorrendo
E eu, seco
olhando pela vidraça
do expediente.
Chovia forte,
quase inundação,
e os carros
se espremendo
escorregando,
lentos
nos trilhos
de asfalto
E eu, seco
nem via a má-sorte
dos indigentes
Chovia forte,
larguei o serviço
ao meio, o carro
num qualquer
meio-fio
Corri para o meio
da multidão
ensopada
E, eu seco
por um beijo que
lavasse minha alma
inconseqüente...
Eric Germano - 9-12-2002
29.11.02
ESBARRÃO
Se eu esbarrar contigo na rua
espero não colidir
como fazem mateoritos incautos
nem passar ao largo
como fazem cometas apressados...
quero ter tempo
de o tempo parar
só por um instante
o tempo bastante
de me ver no seu olhar
Se eu esbarrar contigo na rua
espero não me afogar
como se afogam os foliões
na turba frenética, em blocos
querendo o não vivido
antes das cinzas anunciadas...
Quero ser lento,
quero pairar
mudar de quadrante
negar o distante
na tua boca, desembocar
O NÃO-CONTIDO
O poeta brinca de viver Ludmila
cultiva rosa atenuada, sem espinho
e para fazer crer aquela que vacila
transformorfiza pura água em doce vinho
Não se preocupe, portanto, por tão pouco
prestidigítico, cenário, ilusionismo
sou mais mágico-poeta que louco
e abdico ao confortável conformismo
E antes extravasar, parecer transformante
orvalhante e encasulado, do que contido
tudo que for para alegrar que se cante
e o que for para encantar que seja lido!
Eric Germano – 28-11-02
22.11.02
SEREIA DO PLANALTO
Onde há mar,
maravilhas há!
Onde amar?
Nas ondas do mar!
Ondas sonoras,
ondas de amores
ondas de Bulcão
Onde moras?
Ondulantes cabelos
voam no terral
E a sereia
ensaia o canto
do medo, da paixão
afogamento
no êxtase abissal
22-11-2002
14.11.02
Questão de Referencial
Uma semana é muito
para uma mosca,
mas é pouco
para uma estrela...
e eu vou ficar moscando
enquanto espero revê-la
14-11-2002 Eric Germano
11.11.02
Do Espaço
O astuto Astronauta
apaixonado
pela terráquea Internauta
nem quer saber de vias lácteas
galáxias, super-novas, planetas
constelações, meteoros, cometas,
solares raios
ultra-violetas
Olha para a Terra
boiando, azulada
e sonha... com as viagens
no céu da boca
da amada
11-11-2002
11.10.02
Para uma bibliotecária
Sua vida
São livros descansando em estantes
Eu queria é derrubá-los, tirá-los do sono, das traças
Mudar as capas, subverter a tipografia
Bagunçar o catálogo, incendiar os índices
Escrever novamente a história
Novos fatos, inusitadas teorias
Que teriam que ser novamente e sistematicamente
Organizadas
Para que eu fizesse sentido
Na sua vida...
Bsb, 17/05/99
MICRÔMEGAS (permisso, Voltaire)
De pequenas sementes surgem edifícios
de madeira
e de gotículas em sprays d'água,
a corredeira
De pequenos frascos, saem aromas
e a matança
e com sutis olhares e gestos:
- A noite é uma criança!
De cultivadas ferrugens,
quebram-se jaulas e elos
E com pequeninas tentações,
alguém me disse,
derrubam-se castelos...
24.06.99
23.06.99
SÍNDROME DE TAMAGOCHI
Por que não me apertas, all day
se te olho da tela de aquário
ansiando um alimento, binário
Em apertadas e idéias, me viciei...
E se me penduro como virtual fantoche
em telemáticas linhas, em nylon de rede
E comigo brincas, sem matar minha sede
Do seu apertar me tornei um Tamagochi!
Enfim, fui desprogramado
todos os binários foram invertidos
os arquétipos viraram artigos de olaria
Estão agora expostos, marfim fraturado
Tarantulo tempestades, traços tremidos
Animando semente a ser lançada na pradaria
É, minha cara, é rara sua visão agronômica
Há solos que nos dizem muito pouco
e a fome do nascer acaba por se dissipar...
E há seres em carreira solo, tragicômica
Incompletos, cheios de ranhuras, paredes sem rebôco
Sou um deles então
caia
por cima
de mim
quando
quiser
se semear
16.06.99
SOBRE ÓLEOS
Tem dias que me sinto enterrado
em paredes, micros, horas, cadeiras
E apesar de estar vitrificado
cresço como o fazem as videiras
Eventualmente, um mar traiçoeiro
de invejas, ciúmes, mesquinharia
Faz de mim um pobre estrangeiro
Perco a língua, não há moradia
Às vezes o ar fica rarefeito,
o respirar não é puro instinto
Roxo assim, penso um jeito
de expulsar o ruim que sinto
Raramente, sinto-me arder
em incêndios de paixões delirantes
Mas quando não espero acontecer
Me consomem azeites escaldantes
17.06.99
IMPOSTO
Nada foi exigido ou foi imposto
Quem vive na cobrança, nunca ama
Tributos pagarei sem contra-gosto
Entrego-te o coração como Derrama
PARA UMA GATA NO MEU TELHADO DIGITAL
Numa pesquisa, binária, digital,
Achei pegadas ousadas de uma gata
De imediato, sobressalto, sofri um confisco...
Meu pensamento me trouxe afinal
Para perto de quem tão bem se retrata
- A curiosidade matou o gato! E daí? Me arrisco!
NOTURNOS
Quando fechaste os olhos
Me teletransportei...
Te beijei!
28.06.99
Nada
Nem poesia de Djavan
nem a foto do mar que vejo
Aplacam a sede instalada
Que sinto toda manhã
Se não navego no teu beijo
Tudo
Faria, sem arrependimento
Apaixonado, louco, comovido
Cometeria suaves absurdos
Para viver o exato momento:
Direi - Te amo!, em seu ouvido
15.06.99
10.10.02
MÚSICA VIDA MÚSICA DE ASSIS
A todo momento
Inicia-se nova melodia
Saída de unhas moldadas
No afago de aços esticados
Sibilos pinçados rasgam o ar
A todo momento
Cala-se alguma harmonia
No contraponto, cortinas fechadas
E acordes inusitados
Viram pausas, sem retornar
Tem a vida esse movimento
E alguns tiveram a sabedoria
De brincar com folhas pautadas
E palhetear em mil trinados
Deixando a alma ecoar
Mas tem sua hora o movimento
E o gran-finale chega um dia
Mas o esperto preparou as viradas:
Compôs sétimos-maiores-encarnados
E atraiu seu próprio continuar...
Eric Germano – 25.07.2000
7.10.02
UM DIA, DIREI-TE ADEUS
Soube tudo da tua beleza:
cada centímetro linear e cúbico
cada cheiro exalado e mágico
cada sussurro e cada grito
cada sabor de doce e ácido
cada olhar de adeus oblíquo
E eu ingênuo e lento
perdi todo o raciocínio
e vivo o tormento cálido
no mau hálito do improviso
arrancando os pentelhos
da orelha de um livro
que me deixa mais esquálido
quanto mais é lido
Nessa página, sem a pena
Peno como um varrido
Doidivanas do planalto
Procurando o perdido
Levo a vida é na valsa
Apartado da beleza
apalpada, cheirada,
ouvida, devorada
Só o adeus é meu abrigo...
2.10.02
Venha quando puderes,
venha se quiseres!
Fique se puderes...
Fique se quiseres!
Fique, se tiveres que voltar!
Volte se tiveres que voltar...
Volte se quiseres!
Volte, querendo ficar.
Volte a ficar (comigo)
Fique sem voltar
Queira-me se puderes
Fixe-se se quiseres
Mas não voltes atrás!
Eric Germano 26-09-02
1.10.02
A COR DA INSPIRAÇÃO
Mutante acorde
Que serpenteia nos tímpanos
E acorda mosaicos de janelas
cortando montanhas de decotes
Onde correm rios de cerveja
Juntos com Hendrix, e por todos eles
Douradas cordas que nos segurem
Pois as ondas nos levam
E trazem os amigos,
E a concordância, no fim
De que todos alí,
Naquele bar, etilizados
E enfim acordados
Viram cores inexplicáveis
que reviram indomáveis sentimentos
Derramadas, em oferta
Como gole de aguardente
Deixada para o Santo
Eric Germano 09/07/2002